domingo, 27 de setembro de 2015
Por Bruna Corrêa
Ambientado na
década de 60 em Jackson, Mississipi (EUA), “A Resposta” é um livro que não
somente fala sobre raça, mas também sobre a coragem que existe dentro de cada
um de nós. É dividido em capítulos narrados sobre a perspectiva de três
personagens distintas, cada uma com suas características peculiares e todas
muito bem construídas. Conhecemos Aibileen, uma empregada doméstica negra que
ama cuidar das crianças de seus patrões brancos. Srta. Skeeter é uma recém-formada
jornalista de pele clara e rica, amiga das mulheres que pertencem à alta sociedade
daquela cidade, mas que não concorda com as atitudes que estas mantêm com quem
trabalha para elas. Skeeter faz uma proposta inusitada para Aibileen: contar a
vida cotidiana de Jackson, Mississipi, pela visão de empregadas domésticas. Com
medo das consequências de tal atitude, Aibileen nega a princípio, mas depois
aceita e começa a incentivar outras empregadas a contribuírem com os relatos do
livro. Minny, sua melhor amiga, é a primeira a aceitar e o faz no início muito
a contragosto – ela é uma mulher que não possui papas na língua, o que a levou
a ser demitida por várias famílias brancas.
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi1f3FjzXczxAilGJICiwUgbqIFjU8mwTjqhIYBt6-9wEaN7G18StncGMyrVFagXpR2VOsWZcc-yaRQ5tKmGxY2blgbCOHNzCtFftTNdq2lqg8OpmGvl4ImUIJsz4BE1NNhoM7hyDvAH0k/s320/the-help.jpg)
- Deverá haver escolas separadas para brancos e negros;
- Qualquer indivíduo que realizar divulgação, por algum meio de comunicação, de opiniões a favor da igualdade entre negros e brancos ou do casamento inter-racial, deve ser preso por até seis meses ou pagar uma quantia de no máximo quinhentos mil dólares;
- O casamento entre uma pessoa branca e outra que apresente 1/8 de sangue negro ou mais é proibido e deve ser invalidado;
- Hospitais deverão ter áreas específicas para negros e brancos, sendo que a porta de entrada de ambos deverá ser separada;
- Prisões deverão ter todos os seus ambientes separados por cor, incluindo o refeitório;
Embora tenha
foco nos preconceitos sofridos pelas empregadas domésticas, o livro pincela
vários momentos importantes para o Movimento dos Direitos Civis dos Estados
Unidos da América. Ataques aos negros são noticiados constantemente, alguns
realizados pela organização racista Ku Klux Klan; em um momento, é noticiado o
caso de James Meredith, o primeiro negro a tentar se matricular na Universidade
do Mississipi. Ele é impedido pelos estudantes brancos e é preciso que JFK, o
presidente da época, envie o auxílio da Guarda Nacional para garantir a sua
matrícula. Vários outros casos fazem parte da pauta da conversa entre Aibileen
e Minny, como a menção à Rosa Parks, negra que se negou a ceder o seu lugar no
ônibus para um branco, e as várias vezes em que negros tentaram frequentar
bares para brancos e foram repudiados.
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjgMeGga_82Pv4TN5fEGq2MlWDmBljeSv3rzfcJ3NUaRHwVi7pNbFQb85nXWR3oU8Ot4xC3qmRHVPbZ2f5fJ9DwdXfJdUR0rsvCHvrUE5-zjo96rZqBTji3qA6YOmzeBBshdGqptzvOAvA/s320/6a00d8341c630a53ef0153908fbfec970b-600wi.jpg)
Hilly Holbrook
é uma personagem totalmente detestável. Uma das poucas características que a
redimem é sua completa devoção aos filhos – particularidade que falta a
Elizabeth Leefolt, que é, também, a patroa de Aibileen. Estas duas mulheres
são, a princípio, as melhores amigas de Skeeter – situação que lentamente vai
mudando conforme o livro se desenvolve. O cast
de personagens femininas neste livro é muito interessante – a participação
masculina é irrisória, os homens são meramente citados ou senão fazem poucas
aparições, como Stuart, interesse amoroso de Skeeter, e Johnny Foote, esposo de
Celia Foote. No entanto, isto não exclui o peso dos homens neste livro, afinal
estamos falando da década de 60 dos EUA, onde o machismo era gritante.
Por exemplo,
quando Skeeter vai procurar o seu primeiro emprego, logo no início do livro,
ela nota que a parte do jornal dedicada aos empregos masculinos era longa,
enquanto a feminina se consistia em apenas uma pequena parte. Mas óbvio que
seria assim – mulheres não costumavam trabalhar. Pelo menos, não mulheres de
classe média ou alta. Elas eram criadas para casar – estudavam, e tudo mais,
mas existia uma enorme pressão por parte da família para a garota “fisgar” um
rapaz. No caso, Skeeter já é considerada uma solteirona; afinal, concluiu sua
faculdade e nunca sequer teve um namorado, no auge de seus 23 anos. A pressão
social, então, é terrível – sua mãe fica constantemente a criticando por seu
cabelo, altura e seus modos, e suas amigas de certa forma sentem pena por ela.
Celia Foote,
embora bonita e amável, é considerada “lixo branco”, porque veio de um ambiente
pobre e não tem “classe”. Ela é a patroa de Minny, e desconhece os limites
impostos pela sociedade, no que se refere à relação entre negros e brancos. Minny
fica completamente confusa pelas atitudes de Dona Celia, se perguntando se a mulher
é louca ou simplesmente estúpida. Ela fica com a última opção.
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj7RVZ4CZsBTO80fR6texIpwodzq2w_h1dKLKXZ4uIelaUscy9kW2yEQmMDIy1NXocyLl6AtWPz6IDa47Zd4rWL-BxIfetWrQ6YECtLrgtngeefOwTWiaFh4WwJyy14zKwBHIU-nQjhiBo/s320/a-omalley-help.jpg)
Minny vive um
relacionamento abusivo com seu marido Leroy. Na situação dela, com cinco filhos
para criar e um salário irrisório, a chance de se divorciar é quase nula. Neste
post aqui eu falo sobre os motivos
de uma mulher continuar em uma relação opressora, e como falei, a mulher nem
sempre pode sair de uma situação assim facilmente, e isto não quer dizer que
ela seja fraca. Minny é uma personagem de opiniões e discurso fortes, mas em
sua intimidade não consegue evitar o seu marido. Acontece.
Tenho de
comentar o quanto amei essas mulheres –Amei o jeito esquisito de Skeeter, a
língua afiada de Minny, a bondade e fragilidade de Celia. Mas me apaixonei principalmente
Aibileen. Sua coragem, sua força de vontade, e principalmente sua maternidade
aflorada faziam com que meu coração se derretesse a cada capítulo narrado por
ela.
Este foi um
dos melhores livros que li na vida. É de uma simplicidade e riqueza que se
contrastam e fazem a leitura fluir de modo delicioso... Como já falei, as
personagens são muito bem construídas, nos permitindo uma identificação que
ultrapassa tempo e raça. Se eu dei a entender que a história é muito dramática,
adiciono: realmente tem drama, mas também existem partes divertidíssimas que me
fizeram rolar de rir.
O filme,
chamado de “Histórias Cruzadas” ou “The Help” (nunca irei entender a confusão
que as editoras/agências de publicidade fizeram com os títulos desta obra) é
muito bom, também. Embora diferente do livro em alguns aspectos, compensa pelas
excelentes atuações. De todo modo, a história nos mostra algo que um sábio uma
vez falou: “A felicidade pode ser encontrada mesmo nas horas mais sombrias, se
a pessoa se lembrar de acender a luz”.
Referências:
Examples of Jim Crow’s Laws. The
Jackson Sun. 2001. Jackson, Mississipi. Disponível em: <http://www.ferris.edu/news/jimcrow/links/misclink/examples/homepage.htm>
Mississipi: A place apart. American Radio Works. 2015. Los
Angeles. Disponível em: <http://americanradioworks.publicradio.org/features/mississippi/a1.html>
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